quarta-feira, 31 de outubro de 2012

13 horas com mabecos


Adivinhem quem está em Matamanene durante 3 semanas? Uma equipa da BBC para filmar mabecos aqui no parque! Depois de ter visto carradas de documentários de vida selvagem, acaba por ser um bocado surreal estar no mesmo sítio que esta malta e conhecer o Herbert que está a fazer um documentário sobre leões, que provavelmente será da National Geographic, e agora malta da BBC aqui em Liuwa Plain.

BBC em Liuwa Plain National Park

Depois de ter estado a observar leões, pensava eu que tinha sido algo hardocore: acordar às 4:30, ficar no carro até à hora de almoço e mais um bocado de observação à tarde... sabem que mais? Isso não foi nada!
Parece que os tipos da BBC não querem filmar de noite, no entanto os mabecos, ainda por cima com a lua cheia, agora fartam-se de andar à noite e como não há tempo a perder para os encontrar de manhã, heis que a minha tarefa é ficar com os mabecos a noite toooooooooooooda!

Ontém posso dizer que foi dos dias mais longos de sempre, acordei ás 6 da manhã para vir para o parque e às 18h estava a ir ter com os mabecos. Comigo tinha um prato com o jantar, um pacote de bolachas, duas garrafas de água, e o sistema de telemetria para encontrar e seguir os bichos (20 neste caso) caso os perdesse de vista. Foi uma longa noite, sentado no carro durante 13h!
De cada vez que os encontrava e eles se deitavam um bocado punha o despertador para 30 minutos mais tarde, passava um pouco pelas brasas, acordava e na maior parte das vezes eles já lá não estavam, aí ia eu à procura deles: uma mão no volante e nas mudanças, a outra a segurar a antena de fora da janela e o receptor no meu colo para ouvir se me estava a aproximar ou não, ora mais para a esquerda, ora para a direita...

Não foi nada fácil, devo dizer que as minhas costas estavam em papa e o meu braço de estar quase sempre esticado a segurar na antena já doía um bocado. Já para não falar de como urinar quando se está rodeado de hienas e mabecos?! Bem, não se pode conter isso eternamente e há alturas em que tem mesmo de se mandar uma mija... e não foi assim tão complicado, as hienas estavam entretidas com o gnu e os mabecos estavam deitados e ver o panorama, foi só abrir a porta do carro e mandar uma mija mesmo ali ao lado protegido pela porta para não me verem como um humano mas sim como um animal estranho com 4 rodas. Enquanto vertia águas mantinha sempre um olho no burro e outro no cigano, não fossem os animais aproximarem-se.

Mas foi como viver num documentário! Foi brutal vê-los a tentar caçar gnus à noite, não é que visse muito, tal era a poeirada no ar que a caçada provocava, mas entretanto lá conseguiram caçar, eu não vi, foi numa daquelas alturas em que adormeci e pufff... perdi a acção, mas quando cheguei perto deles, não eram mabecos que se estavam a banquetear, mas sim um grupo de cerca de 15 hienas. Foi brutal estar no carro a 5 ou 6 metros de 15 hienas ao molho a devorarem um gnu, ou deverei dizer chafurdarem numa carcaça de gnu, ouvi-las a grunhir e ouvir o som dos ossos a quebrar(!) e andarem à pancada umas com as outras. Os mabecos, coitados, limitaram-se a ficar ali deitados a vê-las a comer o que lhes pertencia. Como é que sei que foram os mabecos que caçaram? Bem... toda a noite vi hienas e seguir os mebecos por onde quer que fossem e é uma coisa que fazem frequentemente: seguir os mabecos, esperar pela caçada e roubar o troféu.
 Chegando a casa, foi comer qualquer coisa, lavar os dentes e cama... eram quase 8 da manhã e esperava dormir até às 14h pelo menos... pois... esperava, às 10:30 já estava acordado, a suar que nem um porco e não conseguia estar mais tempo na cama... tinha que ir para um sitio mais fresco e com tanto calor nem conseguia dormir mais...

Hoje aproveito para descansar e dormir, amanhã será mais uma longa noite com os mabecos.

P.S. Desculpem lá não haver fotos... mas de noite as fotografias com a minha máquina são uma bosta e o máximo que consegui foi uns videozinhos.

Tudo a postos para uma trovoada

As flores começam a rebentar por todo o lado

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Liberdade, finalmente!


Após quase três semanas em Kalabo, que me souberam a mel, depois de 4 semanas quase consecutivas em Matamenene, chegou a hora de voltar ao parque por uns dias.
Gnus e crias

Parece que os leões machos na semana passada, entraram cerca de 50 Km em Angola, ficaram lá por um dia e voltaram... voltaram? Voltou...
O macho que não tinha coleira desapareceu nessa viagem... não se sabe o que aconteceu, só sabemos que nunca mais foi visto desde então. O macho que voltou, voltou magro como nunca o tinha visto...  Assim, libertar as leoas tornou-se a nossa prioridade.
Lady Liuwa no último dia de cativeiro
Com este objectivo em mente aí fomos nós para Matamanene, o plano não podia ser mais simples: um gnu para as fêmeas a uns metros da entrada da vedação para as atrair para o exterior, e em simultâneo outro gnu para o macho, para prevenir que ele viesse à carcaça das fêmeas e dificultasse a saída destas da vedação.

Lady Liuwa e o gnu... ou o que restava dele

Com a fase 1 do plano concluída com sucesso, restou fazer figas e esperar que fêmeas e machos se encontrassem rapidamente e formassem um grupo.
Agora veio a parte mais dura, mas bem fixe, de tudo isto: ficar a observar horas e horas as leoas para saber como é que o encontro entre macho e fêmeas iria ser... foram dias a acordar às 4.30 da manhã e ficar a observar 5 ou 6 horas de seguida, o meu rabo já estava dormente e de vez em quando não conseguia evitar fechar os olhos por uns minutos. Mas fogo, valeu bem a pena e os leões estão bem e recomendam-se!

Lady Liuwa 1

Lady Liuwa 2

Em liberdade!

A observar as presas

The Lion King

Entretanto, no sábado tive que ir buscar um senhor a Mishulundu e levá-lo novamente a Mishilundu, com uma hora de caminho entre Matamanene e Mishulundu, foram 4 horas de trabalho ou 4 horas de passeio pelo parque, dependendo do ponto de vista, o que resultou em mais umas fotos, aproveitando estar numa outra zona do parque que ainda não tinha visto.

pelicanos e marabus

a caminho de Mishulundu

















É verdade! Já me esquecia! Com o aproximar da época das chuvas já se vêm umas cobrinhas por estas bandas! Uma manhã em Kalabo, acordo com os cães de R a ladrar, aproximei-me e tinham apanhado uma Boomslang que acabaram por comer deliciados. No dia seguinte, novamente uma Boomslang em Kalabo, desta vez na WC de R! Eheheh! Por fim, a caminho de Matamanene cruzámo-nos com uma Black Cobra que atravessava a estrada à nossa frente, devia ter uns 2 metros à vontade, e foi tão fixe quando ela levantou a cabeça e ficou com o “pescoço” com aquela forma típica das cobras capelo.
Ainda não vi nenhuma Black Mamba nem nenhuma Piton, mas ainda não perdi a esperança! Ah claro, já para não falar dos Nile Monitor Lizard, com cerca de 1 metro de comprimento, que costumam passear perto da minha tenda em Kalabo...
Nile Monitor Lizard
P.S. Hoje reparei que o meu pão estava com umas pintas azuis e amarelas... dizem que é bolor, a mim soube-me a pão com queijo roquefort.

sábado, 13 de outubro de 2012

Parabéns a mim tra la la...


Epah que dia de anos tão igual a tantos outros aqui! Para variar, sozinho...
Já tinha ouvido falar que com a idade a avançar, cada vez mais o dia de aniversário deixa de ser um dia de celebração e festa e passa a ser um dia de tristeza. Celebrar o quê? O facto de estarmos a ficar velhos como o raio? Qualquer dia estou um trintão! Vou festejar isso? Fazia sentido quando tinha 17 anos e queria fazer 18 para tirar a carta de condução... agora!?
Depois de um almoço sumptuoso composto por um refogado de cebola, alho francês e soja, acompanhado por um imaculado arroz branco, a tarde foi passada no skype, a ler o Colapso e heis que me ia preparar para ver um filme quando oiço batucada e gritaria...

Serão os Radiohead em Kalabo? O Cristiano Ronaldo? O Durão Barroso teve um AVC? O Passos Coelho foi atropelado por um comboio? 

Como não podia deixar de ser fui ver o que se passava, agarrei na máquina fotográfica e lá fui eu a chinelar pela areia fora, coisa que parece mais fácil do que é na realidade porque um dos chinelos está sempre a soltar a coisa que agarra ao dedo... made in china diz ele.

Epah grande maluquice! Dezenas e dezenas de pessoas a  gritar e a dançar, pessoal mascarado a fazer macacadas e a dançar, a multidão ao rubro!
Chegando lá perguntei “Isto é alguma celebração? Hoje é alguma data especial?”, “é sabado” responderam-me. 
Acho que na verdade estavam a celebrar o meu aniversário e nem sabiam!

Beijinhos e abraços a todos! 
festa rija em Kalabo!

as anciãs também fazem a festa


o branco (mukua) nunca passa despercebido por mais que tente...

o mukua em kalabo a ser atentamente observado pela pequenada



sábado, 6 de outubro de 2012

Patrão fora, dia santo na loja


Normalmente a hora de ir para o escritório é por volta das 8h. Quinta feira, às oito fui ter a casa da Raquel para ver se ela ja estava pronta para irmos para o escritório, cheguei lá e disseram-me que ela já tinha saído mais cedo. Ok pensei, deve ter tido alguma coisa para tratar de manhã, agarrei num dos carros e pus-me a caminho do escritório. Chegando lá estranhei não ver o carro da Raquel: “Sabem da Raquel?  Pensava que ela estava aqui.” “A Raquel? Ah, ela foi hoje de manhã para Lusaka para ir de férias”. Ahahahah! Eu sabia que ela ia de férias na proxima semana, mas ninguém me disse que era na 5ª... inclusivamente ela própria! Hummm... é ridículo eu sei.

Mas é como diz o ditado, “patrão fora, dia santo na loja” e foram uns santos dias sem dúvida! Quinta e sexta fiz o que tinha a fazer no escritório de manhã e aproveitei as tardes para ir andar de kayak e dar uns mergulhos, andando de kayka pelo Luanguinga, de vez em quando encontram-se uns bancos de areia que são autênticas praias paradisiacas, a água é mesmo transparente e a temperatura óptima! Não vi nem crocodilos nem hipopótamos por isso não se preocupem. Aliás, há sempre imensos miúdos a tomar banho no rio e imensos barcos a remos de passagem.

 

À noite decidi ir jantar a um dos restaurantes aqui em Kalabo, há um que dizem que é o melhor de todos e foi para lá que me dirigi. No entanto esqueci-me de um pormenor... dinheiro! Tinha ficado em casa e estando a pé era meia hora para trás... pensei, vou aqui só beber uma cervejinha e depois vou para casa. Mas entretanto encontrei o Chris e o Adrian e fiquei com eles a beber uma cervejinha, entretanto chegaram mais uns scouts e quando dei por mim, estávamos a beber cervejas atrás de cervejas e a falar de como resolver o problema R aqui em Liuwa... Começam a cair umas sementes de revolução aqui em Kalabo! Eheheh!

É que pelos vistos não encontro ninguém que vá à bola com R e toda a gente na aldeia se queixa do mesmo... é o próprio projecto de conservação que está em jogo e a direcção deveria saber disso... 
Só um exemplo: como é que alguém que ganha cerca de 3000$/mês limpos e tem casa, carro e gasóleo da empresa se pode queixar que os ordenados mínimos na Zâmbia subiram para cerca de 150$? Acho que isto diz muito sobre o carácter de uma pessoa...

Qualquer dia já se arrancam mangas das árvores!

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Hipo!


Não pensem que ando a viver as aventuras dos PQM* todos os dias! Agora em Kalabo o risco de aventuras aparecerem em cada esquina é diminuto. Acordar cedo, ir para o escritório, trabalhar ao computador, vira a casa almoçar, voltar para o escritório, passar pelo mercado para comprar qualquer coisa que esteja em falta: açucar, legumes, pão, chegar a casa contemplar o rio, jantar, ver um filme e dormir.
Mas hoje aguardava-me uma surpresa quando vim a casa almoçar. A uns 50 metros da tenda,     mesmo no meio do Rio Luanguinga estava um hipopótamo! Ehehe! Que comédia! Era ver os barcos de pescadores a passar e mal viam o hipopótamo paravam os barcos ou iam o mais lentamente possível junto ás margens enquanto pessoas do outro lado do rio faziam barulho para afastar o animal.

Hipopótamo visto da tenda (pontinho preto no meio do rio)

Agora em ponto grande
Hoje arranjei (finalmente!) uma cana de pesca, não é mais do que uma vara de bambu com uns 4 metros de fio de pesca atado na ponta da vara e um chumbo e um anzol. Agora só falta arranjar minhocas e posso começar a comer peixe com fartura, pelos vistos aqui neste rio e bem perto da tenda apanham-se belos peixes!

Nascer da lua em Kalabo
*PQM – Partido dos Quatro Malucos. Nome que eu, a minha irmã e os meus primos João e Carlitos adoptámos quando éramos putos (não somos ainda?) e andávamos em aventuras, ora na Ribeira de Seiça, em baldios (a Montanha!), casa do Tio Zé em Manique, prédios abandonados, praias, sofás...